Os bastidores dos memes no Brasil

Os bastidores dos memes
no Brasil
Muito mais do que apenas piadas e trends, os memes são hoje uma linguagem que faz parte de um mercado lucrativo no Brasil ao mesmo tempo em que é palco de disputas políticas

Ao gravar a cena em que sua personagem Nazaré Tedesco, a grande vilã da novela Senhora do Destino (TV Globo), acaba de ser presa, a atriz Renata Sorrah não poderia imaginar que, 12 anos depois de ir ao ar, essas imagens passariam a ser vistas no mundo inteiro. Mas foi o que aconteceu. No ano de 2016, a cena em close de Nazaré reflexiva olhando para as paredes virou o famoso gif da “Nazaré Confusa''. Bastou a um internauta recortar o frame e adicionar fórmulas matemáticas ao redor da personagem para criar o meme que marcou a internet.
O sucesso foi estrondoso. O meme da "Nazaré confusa" ultrapassou as fronteiras do Brasil e viralizou na gringa, sendo conhecido por lá como “Math Lady” ou “Confused Blondie” (“Moça da Matemática” e “Loira Confusa”, em tradução livre). Na época, Renata Sorrah chegou a tentar resolver problemas matemáticos na televisão e, em 2017, a TV Globo reprisou Senhora do Destino na Sessão da Tarde.
A “Nazaré Confusa” foi uma das primeiras demonstrações da força dos memes brasileiros. A partir de seu sucesso, o Brasil descobriu o potencial da linguagem memética e alguns profissionais se voltaram a esse fenômeno comunicacional da internet. Foi mais ou menos nessa época que o então adolescente Gabriel Félix tomou uma grande decisão em sua vida. Nativo digital e criador da página South America Memes (SAM), o jovem percebeu que os memes estavam ganhando cada vez mais destaque e decidiu apostar nesse mundo profissionalmente. Assim que acabou o Ensino Médio, mudou-se do interior paulista com destino ao Rio de Janeiro para realizar o sonho de trabalhar com memes.
Hoje, aos 23 anos, Félix, como gosta de ser chamado, trabalha como Criativo na Flocks, uma produtora de conteúdo digital que une marcas a influenciadores e páginas de memes, criando e fazendo a curadoria de conteúdo para a SAM, perfil com quase 4 milhões de seguidores no Instagram. Ele também idealizou e hoje organiza o Meme Awards, a maior premiação de memes do mundo, cuja quarta edição está em curso neste mês de agosto e vai revelar no próximo dia 30, em um evento com apresentação do comediante Diogo Defante e shows de grandes artistas, os melhores memes e páginas do último ano.
Assim como a Flocks, outras empresas passaram a ver os memes não só como piada, mas também como algo sério. Hoje, seis anos após a criação da “Nazaré Confusa”, o mundo dos memes está transformado. A Nazaré já é considerada um clássico, novos virais surgem todos os dias e o sonho do jovem Félix hoje caminha para uma realidade: fazer memes está se tornando uma profissão.

O meme como negócio

Há alguns anos, a maioria dos memeiros - como são
carinhosamente chamados os criadores e curadores de memes
- diria que não, mas, hoje, é possível ganhar dinheiro com esse
trabalho. As transformações no mercado publicitário têm
contribuído para o desenvolvimento de um mercado de memes no Brasil.
Félix, que mantém a SAM desde 2015, acompanhou toda a trajetória dessa profissionalização. Apesar de criadas muitas vezes despretensiosamente, as páginas de meme sempre foram um trabalho para seus administradores, afinal, postar conteúdos novos todos os dias e alcançar bons resultados requer dedicação. Por isso, muito antes do mercado publicitário começar a olhar para esse mundo, os memeiros já tentavam arrumar meios de remunerar sua atividade. “Quem conseguia tirar dinheiro era vendendo produtos, porque não existia publicidade. Em 2016, 2015, não existia. O dinheiro foi um bom tempo de vendas, de produtos”, diz Félix.
A Flocks foi uma das agências pioneiras a implementar a linguagem memética na publicidade brasileira. Contrataram Félix e outros criadores experientes em memes para sua equipe e começaram a buscar parcerias dispostas a apostar nessa ponte entre memes e marcas. O início não foi tão fácil. Entre muitos “nãos”, conseguiram trabalhar com algumas pequenas marcas e chegaram a divulgar calmantes, mas, com o tempo, marcas maiores começaram a entender que é possível usar os memes como estratégia de campanha e, em 2019, a Flocks conseguiu fechar com a Fanta. Depois disso, trabalharam para muitos outros clientes e conseguiram patrocínio para realizar a primeira edição do Meme Awards, em 2019, o maior evento a reunir os criadores e apreciadores de meme para celebrar essa forma cativante de comunicação.
Eu estou onde estou hoje por causa desse dinheiro de publicidade. Eu terminei a escola com 17 anos e estava com vários planos, mas simplesmente larguei tudo e fui morar no Rio de Janeiro porque eu via um futuro nesse mundo
Félix, fundador e idealizador da South America Memes e do Meme Awards

De acordo com Murilo Lemgruber, Coordenador de Projetos na Flocks, o mercado está cada vez mais aberto para o mundo dos memes e da internet. “No último Big Brother a gente teve a Inês Brasil estrelando a campanha da Avon, algo que alguns anos atrás era inimaginável”, argumenta. A webcelebridade ganhou fama quando seu vídeo de inscrição para a décima terceira edição do reality, sua quinta tentativa de se tornar uma sister, viralizou na internet. Sua participação na campanha de uma das maiores patrocinadoras do programa em 2022 mostra que a força dos virais já ultrapassou as barreiras da internet.
Murilo acredita que o mercado de memes no Brasil é, se não o maior, um dos maiores do mundo. Em seu trabalho para o Meme Awards, o publicitário fez um acompanhamento minucioso das páginas de meme latinoamericanas a fim de encontrar candidatos para o prêmio de Melhor Comunidade da América Latina e opina: “não só o Brasil realmente é o maior criador de meme em si, as páginas são maiores e os conteúdos são mais criativos e têm um alcance maior, como as marcas são muito mais abertas a trabalhar com essas páginas”.
Além de parcerias com páginas já consagradas, muitas marcas estão fazendo de seus próprios perfis nas redes sociais uma espécie de página de memes. Grandes empresas como a Bis, o Guaraná e a Ponto (antiga Ponto Frio) já usam dessa estratégia no Twitter, por exemplo. Para Murilo, esse é um movimento benéfico porque além de reafirmar o meme enquanto linguagem que comunica e vende, também gera remuneração e emprego para os entendedores de meme.
O dia a dia
Mesmo que esteja em ascensão, o mercado de memes ainda está se estruturando. Na Flocks, Félix diz que eles ainda estão entendendo quais são os tipos de profissionais necessários para atuar no meio, que ainda é muito novo: “estamos meio que criando funções e criando trabalhos”, diz.
Júlio Emílio, um dos fundadores da página Saquinho de Lixo, que tem mais 1,6 milhão de seguidores no Instagram, relata que seu processo de trabalho também vem passando por mudanças. Criada em 2018, a Saquinho, para os íntimos, surgiu a partir da reunião de seis amigos virtuais em um grupo de Whatsapp. Todos partilhavam do mesmo senso de humor e decidiram compartilhar as esquisitices engraçadas que pensavam e viam por aí com o mundo.
O grupo é, desde então, o termômetro da página: tudo que é publicado é aprovado por ali, com os demais. Porém, desde que a Saquinho começou a crescer e a fechar publicações patrocinadas, os administradores precisaram se adaptar a novas necessidades. “É muita coisa envolvida para parecer despretensioso, para parecer que é orgânico”, diz Júlio sobre o processo criativo e burocrático das publicações patrocinadas, que envolvem contratos, reuniões de briefing, calendários de postagens, conversas com advogados, dentre outras coisas que normalmente não fazem parte da rotina da Saquinho.
“Não existe nenhum glamour por trás. É óbvio que é gostoso trabalhar com isso, mas tem um custo,
como qualquer profissão”
Júlio Emílio, um dos fundadores da Saquinho de Lixo
Ele conta que o fato de não trabalharem nos mesmos moldes de uma agência, como a Flocks, sobrecarrega o trabalho, porque são os seis administradores os responsáveis por tudo, desde as funções criativas até as operacionais. Porém, o grupo não abre mão da liberdade que tem de escolher bem com quais empresas querem trabalhar, sempre levando em conta seus valores pessoais. Mas ele ressalta que fazer memes nem sempre é algo leve. “Quando você trabalha com humor as pessoas não levam a sério justamente porque é humor. Muitos pagamentos são feitos para a gente 90 dias depois de emitirmos a nota fiscal, coisa que qualquer empresa acharia surreal”, relata.
Quem são os famosos "ADM's"?
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Não raro os seguidores de páginas de meme fazem comentários nas publicações direcionando-se aos “adm’s” - internetês para administradores - das páginas. Como são pessoas anônimas,cria-se uma aura em torno dessas figuras que gera uma curiosidade: quem são os famosos “adm's” por trás dos memes que fazem os brasileiros rirem todos os dias?
Ao contrário de Félix, que desde cedo soube que queria trabalhar com memes, alguns “adm's” acabaram chegando a esse mundo mais tardiamente. “Foi aleatoriamente que eu cheguei ao mundo dos memes, foi aleatoriamente que o Saquinho cresceu, foi uma coisa meio desordenada”, diz Júlio, que, na época em que o Saquinho surgiu seguia carreira acadêmica na área de Direito. No começo, foi equilibrando as duas coisas, mas, desmotivado com a crise sócio-política que o país enfrenta e com os cortes cada vez maiores nas universidades, decidiu procurar outras oportunidades. Hoje, é Community Manager na Quid, uma agência de comunicação política, além de trabalhar na Saquinho.
Lucas Olival, Community Manager na Flocks, teve uma trajetória um pouco similar. Bacharel em Educomunicação pela USP, ele trabalhava com atendimento ao cliente em startups quando, em 2018, decidiu criar sua página de memes, a Odebosh. O que começou como um hobby incentivado por amigos, acabou se tornando um sucesso e, em 2020, Lucas recebeu o Meme Awards na categoria de Melhor Comunidade de Memes Referenciais. Foi a partir dessa experiência, que o aproximou ainda mais desse mundo, que ele percebeu que era isso que queria fazer de verdade. Hoje, sua página tem mais de 49 mil seguidores e Lucas está satisfeito conciliando a Odebosh com a Flocks.

“Eu acho que eu sempre fui um memeiro, eu só nunca tive a página de meme. Até que eu entendi que era isso que eu queria fazer, que era isso que me dava tesão de trabalhar”
Lucas Olival, Community Manager na Flocks

Félix, Júlio e Lucas são apenas alguns dos “adm's” de páginas de meme. Com a gama extensa de páginas, muitas vezes geridas por mais de uma pessoa, é impossível traçar um perfil único de administrador. Existem memeiros com histórias de todos os tipos e em todos os cantos do Brasil. E é exatamente essa diversidade que contribui para a cena, já que cada “adm” imprime sua identidade à sua página e, a partir disso, cria um produto capaz de gerar identificação.
De acordo com Pedro Paulo Magalhães, Diretor da Flocks, é benéfico que cada página desenvolva características próprias e autênticas, porque é assim que se cria uma comunidade forte. Da mesma forma que os influenciadores digitais costumam se especializar em alguns temas, as grandes páginas de meme também têm um estilo distinto e reconhecível que com uma determinada audiência. “O nicho sempre engaja mais. E no meio digital, o valor está no engajamento”, diz.
Júlio também considera que desenvolver uma identidade é essencial às páginas e pensa que o anonimato dos “adm's” é uma peça fundamental dessa construção, que ainda contribui para a viralização dos conteúdos. “Quando a gente não é ninguém, dá um ar de mistério, dá uma persona ao Saquinho. Por mais que sejam seis pessoas, a gente sabe qual voz usar, existe um personagem ali. Acho que esse ar misterioso dá um quê de 'não estou tentando muito hitar [viralizar]’ que é um aspecto da piada, você tem que mostrar que não está tentando muito, caso contrário flopa [não faz sucesso]”, explica.
Ainda que sejam muito diversos, Lucas acredita que há algo em comum entre todos os “adm's”: uma raiz comunicadora. Ele opina que “todo mundo tem uma vibe jovem, porque o trabalho de lidar e fazer memes envolve estar sempre muito atualizado, sempre em cima do que está ocorrendo, para conseguir fazer piada em cima disso. Todas essas pessoas têm em si uma vontade muito grande de estar por dentro do que está acontecendo e querer se expressar sobre isso. Essa marca é muito forte em relação aos “adm's” de paginas memes, muito antes até deles terem as suas páginas”.

Muito além da brincadeira: as aproximações entre meme e política


Os memes como os conhecemos hoje estão se desenvolvendo há pelo menos dez anos, quando a internet e as redes sociais começaram a se popularizar no país. Durante esse tempo, tiveram de se adaptar a diversas mudanças sociais que impactaram também o meio digital. Hoje em dia, as grandes páginas de memes já não fazem mais piadas ofensivas, mas isso não é uma realidade desde sempre.
“Lá atrás não só os memes, mas tudo relacionado à internet era muito sem lei”, diz Murilo. Antes da eclosão das fake news com as eleições presidenciais estadunidenses de 2016, as diretrizes de comunidade de redes como o Facebook, o Twitter, o Instagram e o Youtube tinham menos barreiras contra conteúdos inapropriados, tanto do ponto de vista informativo quanto dos discursos de ódio. E esses conteúdos muitas vezes incluíam os memes.
A partir da constatação de que a internet repercute para além do mundo virtual, essas plataformas começaram a ser cada vez mais pressionadas a reformularem seus regulamentos. Com isso, páginas que postam memes inadequados passaram a ser prejudicadas e ter suas postagens derrubadas. Na mesma época, o mercado publicitário passou a olhar com mais interesse para os memes, o que também contribuiu para uma renovação da linguagem dessas páginas. “Nós, da South America Memes, passamos por uma lavagem muito grande nas nossas redes depois de ter entrado para a Flocks, para que fôssemos mais adequados para o meio publicitário. Porque as marcas não vão colocar dinheiro em quem está com o post caindo toda hora por ferir as diretrizes, e acho que todas as páginas de meme seguiram nessa linha”, relata Félix.
Além disso, diante da crise política brasileira, muitos criadores começaram a usar a linguagem memética para se posicionar. Lucas afirma que, em paralelo às transformações provocadas pelas diretrizes das plataformas e pelo mercado, os memeiros também passaram a se responsabilizar mais pelo que publicam em suas redes, que têm milhares de seguidores. “Principalmente de 2017, 2018, para cá houve uma mudança na forma de encarar o meme também a partir de seu peso político. Existe uma atenção muito maior nas comunidades de membros a respeito da responsabilidade de passar um posicionamento, e até mesmo de fazer os seus comentários sobre o dia a dia”, diz.
De acordo com Dandara Magalhães, doutoranda pelo Programa de Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense (UFF) e pesquisadora associada ao coLAB-UFF (Laboratório de Pesquisa em Comunicação, Culturas Políticas e Economia da Colaboração), grupo que coordena o Museu de Memes da UFF, o meme é hoje mais do que só um alívio cômico, uma ferramenta poderosa de transmissão de ideias.
“O meme pode ser uma piada, mas a gente também brinca com coisa séria e o brasileiro, especialmente, tem a característica de rir da sua própria tragédia” - Dandara Magalhães, doutoranda pelo PPGCOM-UFF e pesquisadora associada ao coLAB-UFF

Ela pontua que os memes foram, por muito tempo, percebidos apenas como um instrumento de comédia, mas que, devido ao cenário político recente, em que inclusive as últimas disputas eleitorais estiveram atravessadas por memes, “a gente tem entendido cada vez mais que não é só a piada pela piada e que não necessariamente os memes têm que ser sempre engraçados. A gente tem aplicações de memes nas lutas antirracistas, nas lutas feministas”, diz.
De fato, a relação entre humor e política é basilar. Desde Aristóteles, autor de “Poética”, um dos escritos mais fundamentais sobre a sátira, fala-se sobre o potencial crítico e transgressor do riso. De acordo com o professor da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisador do Media Lab, Paulo Faltay, o que a internet traz de novo a essa dinâmica é a democratização da produção desse humor, que hoje ocorre em uma escala muito maior e mais rápida. Para ele, que ministrou a disciplina de graduação Laboratório de Meme e Política, o “meme assumiu a posição da mídia de informar, mas sem as amarras de analisar e checar tudo”, o que pode prejudicar a compreensão da complexidade de certos debates, já que nem tudo pode ser comunicado na rapidez que o meme exige.
Júlio concorda: “A linguagem do meme é massa, ela proporciona falar coisas muito sérias rindo, mas também tem um limite, não dá para se aprofundar em algumas coisas e eu sentia falta disso”. Para além dessa limitação da linguagem memética, Faltay entende que a necessidade que as redes sociais geram nos usuários de se posicionarem sobre tudo o tempo todo contribui para que os debates sejam esvaziados, ocorram eles por intermédio dos memes ou não.
“Às vezes as pessoas nas redes sociais são especialistas em tudo, tudólogos, têm que ter sempre uma opinião sobre todo novo assunto”
Paulo Faltay, professor da Escola de Comunicação da UFRJ e pesquisador do Media Lab





O meme como linguagem
O meme não surgiu com a internet, mas, a partir dela, tornou-se uma forma de comunicação cada vez mais presente nas vidas das pessoas. De acordo com uma pesquisa da Globosat em parceria com a Consumoteca, em 2019, 85% dos internautas brasileiros consumiam memes. Como diz Murilo, “hoje, o meme atinge desde a criancinha pequena até a vozinha”.
Mas os dados apontam que nem sempre esse consumo é feito da melhor maneira. Uma pesquisa realizada pelo The Economist com o Facebook em 2021 mostrou que o Brasil está na 36ª posição do ranking global de inclusão digital. O levantamento considera tanto o acesso aos meios materiais quanto a qualidade do uso que as pessoas fazem da internet, ou seja, se conseguem comunicar-se de forma plena. A pesquisa também mostra que, considerando este último ponto, da educação midiática, o Brasil se encontra ainda pior, ocupando a 69ª posição.
Para reverter essa situação, Dandara acredita ser fundamental o entendimento de que o meme, linguagem própria da internet, é uma forma de comunicação que, como qualquer outra, “informa, politiza, reproduz informações e também polariza e reproduz mentiras”, diz. Por isso, é essencial formar cidadãos que consigam interpretar e entender os mecanismos dessa nova linguagem para comunicar-se de forma plena, evitando também a reprodução da desinformação e dos discursos de ódio.




Entender que o meme é uma nova (não tão nova assim) forma de comunicação, perpassa a compreensão de que diferentes profissionais vão usar isso nas suas vidas de formas que às vezes nem a gente imagina. É compreender de que forma podemos usar essa linguagem, esse formato, para, informar, educar, inserir no trabalho, conseguir falar com nossos primos mais novos, que seja!”
Dandara Magalhães, doutoranda pelo Programa de PPGCOM-UFF e pesquisadora associada ao coLAB-UFF
Compreender o meme como uma linguagem que atravessa a todos e transborda o digital, implica em assumir sua relevância nos espaços de formação e legitimação de conhecimento, como museus e universidades. Em 2019, o Museu de Memes expôs a mostra “A política dos memes e os memes da política” no Museu da República, Palácio do Catete, no Rio de Janeiro. A exposição teve tanto sucesso de público que foi prorrogada duas vezes.
“O nosso acervo é virtual, a gente trabalha com isso já há muito tempo e isso ajuda muita gente, mas ocupar um espaço físico, uma universidade ocupando um museu para falar de política, para falar de meme, foi uma experiência muito legal que com certeza replicaríamos”, diz Dandara. Ela conta que a exposição foi resultado de um edital que o projeto ganhou e que a iniciativa só não foi repetida ainda por falta de novos recursos.
O Saquinho de Lixo também já levou a linguagem memética para fora das redes. Em 2019, expuseram a videoinstalação “Memelito” na mostra “À Nordeste” do Sesc 24 de Maio, em São Paulo e, posteriormente, participaram da reabertura do Museu da Língua Portuguesa com uma nova videoinstalação.
Júlio conta que ocupar um museu enquanto memeiro foi uma experiência importante porque permitiu questionar os limites da linguagem. “Toda vez que surge uma forma nova de se comunicar ela é controversa, por exemplo, videoarte é uma coisa que quando surgiu as pessoas questionavam se era arte mesmo. Eu acho massa essa discussão, e penso que é muito menos sobre dizer sim ou não e mais sobre entender o que permite que algumas coisas não entrem [em espaços como museus] ou que sempre entrem”, conta.
O Saquinho de Lixo, que sempre se definiu como um coletivo multimidiático, tem buscado outro rótulo. Júlio conta que o grupo quer se distanciar do termo coletivo para se aproximar mais do mercado publicitário e se dissociar de uma sensação imatura e descompromissada que o termo carrega. O “multimidiático”, porém, veio para ficar. Além de ter o desejo de continuar explorando os limites entre a arte e os memes, o Saquinho pretende se lançar muito em breve na podosfera para testar novos formatos de trabalho e estreitar ainda mais os laços com a comunidade de seguidores.


Por isso, para ela, o letramento digital e midiático é essencial e deveria começar desde cedo. “Da mesma forma como a gente aprende redação, interpretação de texto, da mesma forma que a gente fala que deveríamos ter aulas de economia na escola, seria interessante ensinar, por exemplo, o básico de uma edição de imagem para essas crianças que estão o dia inteiro na tela, compartilhando, vendo e consumindo aquilo”, explica.
E você, já pensou em se tornar um memeiro?
Confira as dicas de alguns experts do negócio: